domingo, 14 de agosto de 2011

A testemunha entre literatura e história curso de extensão - 1 UFRJ 22 de agosto (inscrições a partir do dia 15 de agosto: Faculdade de Letras, setor de extensão ) 22/08 a 30/ 09


Curso de Extensão 2011 / 2
A testemunha entre literatura e história. De Primo Levi a Giorgio Agamben

Coordenador (es): Prof. Dr. Andrea G. Lombardi e João Camillo Penna  (UFRJ)
Docentes:       
Andrea G. Lombardi, Prof. UFRJ
Anna Basevi, Mestranda em Ciência da Literatura (UFRJ)
Dra. Ariani Sudatti, jurista, Profa., Pós-doutoranda Unicamp (SP)
João Camillo Penna, Prof. UFRJ
Natalia Indrimi, articulista e Presidente do Centro Primo Levi de Nova York
Tatiana Maria Gandelman de Freitas. Doutoranda  em Ciência da Literatura (UFRJ) e Professora substituta do Instituto de Letras (UERJ)                    
Inscrições: a partir do dia 15/08 na Faculdade de Letras da UFRJ, setor extracurricular
Ementa: A questão da testemunha aparece insistente nos textos dos sobreviventes dos campos de concentração. Esse conceito tornou-se central na reflexão da literatura, do direito e da história contemporânea. A "compulsão a narrar", de que fala Primo Levi (retomando Samuel Coleridge e “A Balada do Velho Marinheiro") liga-se indissoluvelmente a um aspecto radicalmente oposto. Que é a impossibilidade de representar a catástrofe que se verificou na tradição ocidental. Um colápso, ao mesmo tempo,  físico, ético e cultural. Compulsão e impossibilidade representam antíteses e fronteiras que convivem necessariamente numa aporia fundante da literatura. Compulsão e impossibilidade representam a metáfora do espaço virtual na literatura, um espaço em contínua expansão, mas sempre ameaçado de catástrofes e crises.  
Vagas: 40 (quarenta)
Dia da semana: segunda-feira
Horário: das 13h30 às 15h30
Período: (5 encontros) de 22º de agosto a 26 de setembro
Programa:
22/8 – Prof. Dr. João Camillo Penna (docente UFRJ): Giorgio Agamben e o conceito de testemunha. 
29/8 - Dra. Ariani Sudatti, Profa., Pós -doutoranda Unicamp: Consistência da testemunha no direito e na literatura
12/9 – Anna Basevi, mestranda UFRJ : Língua, testemunha e ética em É este um homem? (P. Levi) 
19/9 – Tatiana Gandelman, doutoranda UFRJ: ficção e história em Georges Perec e Primo Levi
26/9 – Prof. Dr. Andrea Lombardi (docente UFRJ) e Natalia Indrimi: testemunha e ética na literatura

Bibliografia: somente indicativa. Alguns dos textos poderão ser encontrados em internet.
Os livros serão disponibilizados em pasta no xérox da Faculdade

ADORNO, Theodor W.  . "Elementos do Anti-Semitismo: Limites do esclarecimento." in: Adorno e Horkheimer. Dialética do Esclarecimento. [trad. Guido Antonio de Almeida]. Rio: Zahar, 1985.
____________________. "Educação após Auschwitz". in: Theodor W.  Adorno. [org. Gabriel Cohn]. São Paulo: Ática, 1986.
AGAMBEN, Giorgio. O que resta de Auschwitz o arquivo e a testemunha Trad.  Selvino J. São Paulo: Boitempo, 2008
CARUTH, Cathy (org.). Trauma. Explorations in Memory. Baltimore/ Londres: John Hopkins, 1995
FELMAN, Shoshana e Dori Laub. Testimony: Literature, Psychoanalysis, History. London: Routledge, 1991
GAGNEBIN, Jeanne Marie. Sete Aulas Sobre Linguagem. História e Memória. Imago, 1997
GUINZBURG, Jaime. Linguagem e trauma na escrita da testemunho http://www.msmidia.com/conexao/3/cap6.pdf

HARTMAN, Geoffrey. The Longest Shadow in the Aftermath of the Holocaust. Bloomington: Indianapolis, 1996
LACAN, Jacques. "Le réel como trauma", in: Seminários, livro X (les quatre concepts fondamentaux de la psychanalyse), 1964
LEVI, Primo. É  este um homem? [trad. Luigi da Re]. Rio de Janeiro: Rocco, 1998
______. Os Afogados e os Sobreviventes [ trad. Sergio Luiz Henriquez] Rio de Janeiro. Paz e Terra, 1990

LaCAPRA, Dominick. Representing the Holocaust. History, Theory, Trauma. Ithaca, London, 1994
LOMBARDI, Andrea In SILVA, Márcio Seligman. História, memória, literatura – O testemunho na Era das Catástrofes. Campinas: Editora Unicamp, 2003 ver in http://eticadaleitura.blogspot.com/2011/08/onde-esta-nosso-irao-abel-artigo-sobre.html

PENNA, , João Camilo. Este corpo, esta dor, esta fome: notas sobre o testemunho hispano-   americano. In: SILVA, Márcio Seligman. História, memória, literatura – O testemunho na Era das Catástrofes. Campinas: Editora Unicamp, 2003. p. 299-348

PEREC, George. W ou a memória da infância. São Paulo: Cia das Letras,  1995
  

SEMPRUN, Jorge. L'ecriture ou la vie. Paris: Gallimard, 1994

TODOROV, Tzvetan. Em Face do Extremo.   Campinas: Papirus, 1995
YERUSHALMI, Josef Hayim. Zakhor. História Judaica e Memória Judaica. Rio: Imago, 1992
WIESEL, Elie. Holocausto. Canto de uma Geração perdida. [trad. Roberto Raposo] Rio: Documentário, 1987




Onde está nosso irmão Abel (artigo sobre literatura de testemunho)

Publico mais um artigo sobre o tema da literatura de testemunho (judaísmo, ética, leitura)

Onde está nosso irmão Abel? [1]
 Este artigo foi publicado em SILVA, Márcio Seligman. História, memória, literatura – O testemunho na Era das Catástrofes. Campinas: Editora Unicamp, 2003 
Coloco ele a disposição para o curso de extensão: A testemunha entre Literatura e Historia 



Interpretação é assassinato
Sigmund Freud

Há um conto dos irmãos Grimm intitulado “Os Dois Irmãos”[2]. O conto começa da forma seguinte: “Era uma vez dois irmãos, um deles era rico e o outro, pobre. O rico era ourives e seu coração era mau; o pobre vivia de fabricar vassouras e era bom e honesto. Ele tinha dois filhos gêmeos, parecidos como duas gotas d’água”. No decorrer do conto aprendemos que o irmão rico e mau convence o próprio pai a abandonar os gêmeos, seus sobrinhos, na floresta. Segundo Bruno Bettelheim, uma das características típicas dos contos referentes a irmãos é a simbolização da identidade.[3] Ele ressalta que os dois irmãos, os gêmeos, simbolizam uma unidade dividida, em conflito. Faltando a cooperação entre os dois aspectos da unidade, haverá uma desagregação da personalidade. “A história afirma implicitamente que se os aspectos contraditórios da personalidade permanecem separados, a consequência inevitável é a infelicidade”, ou seja, a duplicidade não assumida, não trabalhada, leva à infelicidade. Nesta história, os irmãos entram em conflito um contra outro, enquanto os gêmeos (os filhos do pobre e bom artesão) se ajudam mutuamente. Inútil dizer que há um final feliz que pertence aos gêmeos. São eles que cooperam e, desta forma, aceitam a alteridade, seguindo o raciocínio de Bettelheim. O final feliz, portanto, cabe à geração posterior (aos filhos dos irmãos).
Os contos de fada representam de alguma forma um resquício de oralidade, a memória de uma tradição cultural, de que constituem o imaginário, e o material para inúmeras releituras. Eles carregam, de certa forma, o ruído de fundo de uma civilização, pois as releituras não conseguem apagar sua crueldade, a violência, a injustiça. “Na maior parte das culturas – diz Bettelheim[4]– não há uma demarcação clara que separe o mito do conto popular ou da fábula; elas constituem em sua totalidade a literatura das sociedades pré-letradas”.  Nas palavras de Italo Calvino – ele mesmo um grande apreciador de fábulas e organizador de uma coletânea de Fábulas Italianas – a tarefa dos irmãos Grimm “era descobrir os fragmentos de uma antiga religião da raça guardada pelos povos”, com o objetivo de acordar “a consciência germânica”[5]. No mesmo texto ele afirma que a natural ‘barbárie’ da fábula se dobraria, na tradição italiana, a uma lei da harmonia; não haveria aquele “disforme jorrar de sangue dos irmãos Grimm”[6].

O complexo de Abel

A relação entre os dois irmãos (e os gêmeos, seus sobrinhos) da fábula não se desenvolve num clima realmente ‘familiar’; na verdade, é o lado sinistro, o lado perturbante que aflora com força, o que a psicanálise define como unheimlich, a partir de um conto de E.T.A. Hoffmann, literalmente o ‘não familiar’. A partir da interpretação de Bettelheim, devemos presumir que o conflito entre os dois irmãos revela, de fato, um conflito de identidade, entre o sujeito e seu duplo – um tema forte do romantismo, que remonta originariamente à Antiguidade Clássica[7], e que a psicanálise passou a estudar[8]. Torna-se visível o ‘lado obscuro’ da personalidade: um lado unheimlich quer dentro do próprio círculo propriamente familiar (simbolizado pelos laços de parentesco estreitos entre irmãos) quer na própria personalidade dupla do sujeito. O recurso à autoridade do pai, que será induzido pelo irmão mau a levar os sobrinhos na floresta, a levá-los literalmente à perdição (a perder-se, portanto, a morrer), conduz aqui ao conflito edipiano por excelência: os irmãos lutam pela conquista do amor do pai ou por sua confirmação.
Um exemplo de ‘perdição’ paradigmática dentro de nossa cultura pode ser considerada a história de Caim e Abel, a progênie imediata de Adão e Eva, segundo o relato do Antigo Testamento (Gênesis: 4). Caim, o primogênito, cultivava o solo enquanto Abel, o segundo, tornou-se pastor de ovelhas. O conflito explode quando os dois resolvem fazer oferendas a Deus. A oferenda de Caim é recusada e sua reação é rápida e terrível: leva o irmão rumo ao campo e o mata. “Onde está teu irmão Abel”[9], pergunta-lhe Deus. “Não sei. Acaso sou guarda do meu irmão?”. Até aqui o relato bíblico. Não está claro o porquê da preferência (e injustiça) divina. Não há dúvida que Deus, aqui, simboliza o pai – portanto uma espécie de superego freudiano ante litteram. Afinal, Eva afirma (Gênesis 4, 1): “Adquiri um homem com a ajuda de Iahweh”; a ajuda pode ter sido menos simbólica.  O texto do Antigo Testamento é sabidamente lacônico e deixa grandes espaços para que se introduza a interpretação. Há versões em que Caim é apresentado como irmão gêmeo de Abel [10]. E há etimologias variadas para seus nomes: segundo uma, Caim vem de ‘adquirir’, segundo outra de ‘cana’, ‘junco, de ‘serralheiro’. Abel, mostraria ainda uma conexão com ‘vazio’[11], mas também ‘dor’, ‘sopro, ‘vaidade’. Para Graves[12] “O nome de Abel, Hebel, permanece sem explicação, provavelmente porquê a palavra hebel era conhecida e significava ‘sopro’, ‘nulidade’, fugacidade,  referendo-se à vida humana (Psalmo CXLIV 4; Jô  VII 16). Todavia, na tradução dos Setenta hebhel foi escrito ‘Abel’, que, transcrito em hebraico se torna abhel ou ebhel: ‘luto’ ou ‘dor’ ”. Trata-se, portanto, de uma interpretação fundamentada numa dupla tradução. Após a tremenda ofensa recebida por Deus, Caim se mostra irado, ou melhor deprimido, ou as duas coisas juntas:  “Caim ficou muito irritado e com o rosto abatido”[13] ou “e irou-se Caim, muito, e descai-lhe o semblante”[14]. Restabelecendo a sequência lógica dos acontecimentos, teremos inicialmente a rejeição do Pai que causa uma depressão em Caim e, finalmente, o crime: o assassinato do irmão, como forma de vingança que entra em conflito com a lei moral. Após a morte, porém, Caim não demonstra nenhum sinal de arrependimento (“Acaso sou guarda do meu irmão?“): não há luto, não há arrependimento: só haverá uma queixa, contra a culpa que ele carregará: “Minha culpa é muito pesada para suportá-la...”. É interessante considerar que a interpretação do nome de Abel acima citada (a dor, o luto) reúne metonimicamente a dor da vítima do assassinado e o luto não realizado por Caim. 
A tradição do Antigo Testamento apresenta muitas variações do conflito entre irmãos: é o caso de Isaac e Ismael, Esaú e Jacó, Lia e Raquel. Por sua vez, A teogonia grega também está repleta de episódios análogos, onde o conflito ‘interfamiliar’, especialmente em sua versão edipiana, aflora com uma força até maior.  É o caso de Urano que será castrado e destronado pelos filhos, capitaneados por Cronos que, por sua vez, sofrerá o mesmo destino, por seu filho Júpiter. A história de Roma está repleta de tensões semelhantes, basta pensar no conflito simbólico entre Rômulo e Remo, fundadores da cidade.
No primeiro momento, pois Caim entra numa depressão. O texto é muito lacônico, mas, a julgar pelo tamanho de sua decepção, presume-se que a a depressão seja realmente profunda. Sua reação posterior – o assassinato do irmão – decorre de sua inveja: “Nunca teria invejado meu irmão – reclama Caim com Deus – se tu não tivesses preferido suas ofertas às minhas”. O assassinato é proibido, evidentemente, pelas leis e pela moral dominante já naquele estágio da civilização ou é este assassinato que se constitui como modelo para proibição. Se a reação de Deus, que chega a rejeitar Caim, não é compreensível, segundo muitos intérpretes, por apresentar um modelo de profunda injustiça, o fratricídio o coloca no índice da civilização e requer outras versões. Uma delas afirma que Caim foi gerado de uma união entre Eva e Samael, a serpente ou o diabo. Nesta interpretação, é Samael que, ciumento pela união entre Adão e Eva, teria falado: “Destruirei Adão e casarei com Eva e reinarei realmente”. No Novo Testamento (JoãoPrimeira Epístula 1: 3, 12[15]), Caim é apresentado como representante ou filho do “Maligno”, ou alguém possuído pelo espírito maligno: Satanás, Samael ou Lúcifer representam, antes de mais nada, a ambição desmedida e o ciúme: “O orgulho fez com que perdesse o juízo: “Quero ascender acima das nuvens e as estrelas, disse [Lúcífer] e quero ser coroado no monte Saphon... e me tornar assim igual a Deus!”. O assassinato de Abel é uma transgressão, um pecado gravíssimo. Pode-se acreditar, que o fratricídio transmita a Caim e a seus descendentes uma tremenda culpa. Caim torna-se um fora-da-lei, obrigado a fugir sempre (“terei de ocultar-me longe da tua face e serei um errante fugitivo sobre a terra”). Sua punição será ter um chifre sobre a testa, carregar a fama de fratricida e sempre estar possuído por uma angústia, ter uma fome insaciável, estar condenado à impossibilidade da realização de seus desejos, à insônia e ao afastamento da comunidade dos homens. Mas Caim não muda, apesar destas punições. “Ele não parava de cometer atos pecaminosos, acumular riquezas pelo crime, ensinar o mal e viver de forma luxuriosa. Foi ele que inventou o peso e as medidas, pondo um fim à simplicidade dos homens. Foi ele que cercou a terra e construiu cidades cercadas de muros”. Contrariamente à fábula dos irmãos Grimm, a história de Caim e Abel, a de Isaac e Ismael e a maioria das outras citadas pela Bíblia não terão um final feliz.
Caim mostra, portanto, um duplo recalque. Num primeiro momento transforma a falta do afeto do pai em melancolia, dirigindo o ódio destinado ao pai contra sua própria pessoa. Após o assassinado – causado por uma transformação da melancolia em sadismo[16] – não assume sua culpa nem empreende um trabalho de luto pela morte do irmão. Abel é representado metonimicamente pelo seu nome, que, numa das etimologias citadas, significa a dor. Simbolicamente ele se torna o luto – outra acepção do nome – que nunca foi realizado. Para Caim também o nome é metonimicamente sua essência, pois a cana representa o instrumento que matou o irmão. Interpretando seu nome como serralheiro, ele se torna o símbolo do progresso, cujo avanço se fundamenta no assassinato. Talvez é neste sentido que devemos interpretar a frase de Walter Benjamin: “Nunca houve um monumento da cultura que não fosse também um monumento da barbárie”[17].  A história do conflito entre Caim e Abel é típica de nossa tradição cultural e se repete, em outras situações e com outros nomes, mostrando uma compulsão à repetição. A falta de trabalho de luto pela morte de Abel é, de certa forma, um modelo que origina ou incentiva a falta de trabalho de luto em relação à história.
“O luto – diz Freud em seu famoso ensaio “Luto e Melancolia” – é normalmente a reação à perda de uma pessoa amada ou de uma abstração como pátria, liberdade, um ideal, etc. que tomou seu lugar. Em algumas pessoas se mostra no lugar do luto uma melancolia.“[18] Nos primitivos (Totem e Tabu), Freud detecta uma forte “ambivalência de sentimentos originária”, em relação à morte de pessoas amadas. “A suposição que as pessoas amadas mortas se transformem após a morte em demônios deixa uma pergunta em aberto”[19]. Isto acontece, segundo Freud, por que há uma insurgência, uma recusa em aceitar a realidade da perda. Porém, não necessariamente a perda sofrida é real. “Numa série de casos é evidente que [a melancolia] pode representar uma reação à perda de um objeto amado; em outros casos pode-se reconhecer, que a perda é de natureza ideal... Em outros casos ainda... não se pode reconhecer de forma clara o que foi perdido, e deve-se presumir, que o próprio paciente não tem claro, o que ele perdeu”. A questão relevante é que a melancolia está ligada ao inconsciente, é resultado de um processo inconsciente. Quando ela substitui o luto, entram em jogo distúrbios, elementos patológicos dolorosos voltados contra o sujeito e contra os objetos de suas relações afetivas: “A melancolia se configura como um desvio doloroso da disposição do espírito, uma suspensão dos interesses pelo mundo exterior, uma perda da disposição em amar, um impedimento de qualquer capacidade e um rebaixamento da consciência de si...”. A disposição melancólica transfere ao próprio eu tendências agressivas e sádicas, de certa forma é responsável por uma transformação da dor em comportamento agressivo: “Se o amor pelo objeto que não pode ser abandonado recuou em direção à identificação narcísica, o ódio se manifesta em relação ao objeto substitutivo pelo xingamento, rebaixamento...; esta dor lhe assegura uma satisfação sádica”. Ambivalência dos sentimentos e inversão das relações provocam no inconsciente uma transformação das manifestações afetivas que, por sua vez, abrem a possibilidade a um comportamento agressivo ou sádico do sujeito melancólico.

Uma neurose diabólica

De fato, há a versão da lenda de Caim e Abel que apresenta Caim como representante do diabo, de forma que justifica por um lado o comportamento injusto de Deus e, ao mesmo tempo, o tremendo crime de Caim. A inserção do diabo permite uma ligação direta entre inveja e sadismo, uma espécie de “exercício da pulsão de dominação”[20]. A este propósito é interessante um curioso manuscrito do ano de 1677 onde o pintor Christoph Haitzmann descreve sua voluntária entrega ao diabo, aparentemente sem receber algo material em troca. O manuscrito é redescoberto por Freud, que dedica ao comentário um ensaio cujo título é Uma neurose diabólica no século dezessete[21]. O pacto de Haitzmann não é originado pela sua vontade de onipotência, mas é causado por uma depressão, ligada a um grande luto do protagonista e aí que está a questão mais interessante. “Haitzmann faz o pacto com o diabo – resume Freud – para se livrar de uma depressão”. O que é que Haitzmann pede ao diabo? Segundo a leitura de Freud, seu único desejo é que o diabo “se empenhe a substituir seu falecido pai por nove anos... Por causa da morte do pai ele perdeu o ânimo e a capacidade de trabalho; recebendo uma substituição do pai, ele espera ganhar de volta o que perdeu.” Freud a seguir se pergunta: “Alguém que se tornou melancólico por meio da morte do próprio pai deve ter amado esse pai. É muito estranho  que esse homem chega à idéia de substituir o pai amado pelo diabo”. Estranho – talvez – mas não impossível. Haitzmann terminará sua vida num mosteiro, como monge na ordem dos irmãos piedosos de Mariazell, na Áustria: o pacto com o diabo substitui, de certa forma o trabalho de luto, e – inexplicavelmente – a história terá um ‘final feliz’. O manuscrito citado constitui, segundo Freud, uma forte referência para a literatura posterior, incluindo o Fausto de Goethe. Em Haitzmann a falta do trabalho de luto causa, em princípio, o sintoma da melancolia. Mas, num segundo momento, a melancolia é substituida por uma mania que, no caso específico, origina o pacto com o diabo. Não há registros histórico de que este pacto de Haitzmann com o diabo tenha acarretado algum crime, mas – dentro da hipótese de Freud – esta possibilidade esta dada, pois o diabo poderia ter induzido o pintor a agir de forma transgressiva. Em Moisés e o Monoteísmo, Freud defende a hipótese da existência de um vínculo muito singular entre o assassinato de Moisés por parte de seu povo (o ‘assassinato do pai’), e a persistência da religião judaica na história; a continuidade do judaísmo se deveria à memória recalcada deste crime horrível: uma hipótese fantasiosa, que estabelece uma clara hierarquia moral entre judaísmo e cristianismo. Com o ‘assassinato do filho’ pelo cristianismo, ou seja a morte de Jesus, a morte do pai teria sido resgatada, segundo Freud. Judaísmo e cristianismo, em Freud, aparecem como irmãos que brigam pela primazia diante do pai. Como Caim e Abel. A vida e sua representação, a literatura e a história, a psicanálise e a interpretação se misturam, na medida em que o ‘caso Haitzmann’ pode ajudar para a explicação do complexo de Abel.

O Judaísmo do século XX

Estamos acustomados a tratar os nomes como se sempre eles correspondessem a coisas, como se eles tivessem o poder de evocar ‘a coisa’. No caso do judaísmo, a correspondência entre o nome e referente se revela logo como pouco apropriado. Já em 1948 Jean Paul Sartre havia questionado se se podia identificar o judeu pela raça (sic), pela sua religião o pela sua comunidade ‘nacional’. À pergunta acerca do judaísmo, ele respondia que “é o antisemita quem faz o judeu”, ou seja: o judaísmo do século XX é um produto do antisemitismo[22]. Embora haja uma velha polêmica antijudaica[23], parece mais próprio pensar, com Hannah Arendt, que “o antisemitismo moderno começa a se manifestar no final do século XIX”[24]. Muitos são os autores contemporâneos que assumem seu ‘judaismo’ em oposição ao antisemitismo, ou melhor: como reação a ele. Mas ‘assumir o judaísmo’ significa, de certa forma, assumir uma determinada identidade, mudando a identidade anterior. Primo Levi formula isto de forma muito clara: “Fizeram com que me tornasse judeu... Antes de Hitler eu era só um  adolescente burguês”[25]. O próprio Freud declarará em 1930: “Minha língua é alemã, minha cultura, minha formação são alemãs e eu me via espiritualmente como um alemão até perceber o crescimento do preconceito antisemita na Alemanha e na Áustria alemã; desde então prefiro definir-me judeu”. Nos casos de Primo Levi e naquele de Sigmund Freud, a identificação com o judaísmo é produto de uma escolha, uma reação ao antisemitismo.
É difícil isolar no antisemitismo os elementos originados dos vários preconceitos: sociais, religiosos, econômicos, ideológicos. Alguns aspectos e motivações do antisemitismo estão ligados especificamente à tradição cultural de língua alemã. O parentesco tão próximo entre língua alemã e o iídiche, por exemplo, a língua mais falada por milhões de judeus orientais, tem certamente um  peso grande. Há outros complexos típicos da cultura alemã e de sua historiografia, ligados à própria história alemã[26]. O antisemitismo típico do século XX acrescenta à tradição antijudaica a luta contra três elementos, de certa forma novos: o messianismo, a oralidade e a atitude iconoclasta, típica das vanguardas do início do século XX. Certamente, nenhum desses elementos pode ser considerado exclusivamente ‘judaico’, mas deve com certeza muito à esta tradição. Neste sentido, não há como negar uma forte influência do messianismo judaico no enorme movimento social desencadeado pelo marxismo. Por sua vez, a forte ênfase dada à oralidade por parte da psicanálise (a ‘cura pela palavra’), tem comprovadamente uma de suas fontes na tradição judaica. A atitude rebelde das vanguardas artísticas pode, finalmente, ser relacionada à recuperação de elementos da tradição judaica na literatura e na filosofia do início do século. O efeito de fertilização ou, de outro ponto de vista, “desestabilização” social, cultural e ‘psicológica’ destes três fatores no panorama da Europa da primeira metade do século XX é enorme, levando-se em conta a o domínio que a tradição positivista possuia nos meios intelectuais. Há uma hipótese para esta crescente influência de elementos da cultura judaica no tecido cultural europeu: a tendência à integração e assimilação dos judeus na Europa do final do século XIX provocou, de certa forma,  uma disseminação de elementos da tradição judaica, liberados do vínculo tradicional com a religião. Tudo isto leva a considerar o antisemitismo extremado alemão uma condensação de elementos tipicamente alemães junto à reação a estes três elementos novos. Há certamente uma responsabilidade específica alemã em relação ao antisemitismo. Mas o genocídio foi realizado na quase total indiferença da opinião pública ocidental e dos governos aliados, ou melhor: graças  a esta indiferença, pois as informações sobre o genocídio circulavam publicamente. É impressionante a lista de informações e artigos sobre a realização do genocídio, publicadas durante a Segunda Guerra Mundial em revistas e diários – entre elas até a Neewsweek e o New York Times. Houve até encontros de delegações judaicas com o Presidente americano Roosvelt e com o Primeiro Ministro britânico[27]. Se o nazismo carrega a responsabilidade completa da monstruosa decisão de aniquilar as populações de origem judaica, os governos aliados e a opinião pública ocidental se tornaram, ao mínimo, co-responsáveis.

Judeus e Greco-cristãos

Embora muitos especialistas identifiquem uma contraposição entre judaísmo e cristianismo, cuja existência analizam ou rejeitam [28], segundo alguns autores a origem do conflito remonta até o séc. II a.C., quando judaísmo e mundo grego ou greco-cristão formam os dois pólos[29]. O papel central do Apóstolo Paulo no séc. I na gênese e difusão do cristianismo confirma esta interpretação; pois é Paulo que sugere uma releitura que alegoriza e inverte a leitura do Antigo Testamento e, particularmente, o mito de Isaac e Ismael, que ele reinterpreta: “Pois está escrito que Abraão teve dois filhos, um da serva e outro da livre. Mas o da serva nasceu segundo a carne, o da livre, em virtude da promessa. Isto foi dito em alegoria. Elas, com efeito, são duas as alianças” (Gálatas, 4, 21). É Paulo que estabelece uma  correspondência rígida entre os dois filhos de Abraão: Ismael com os judeus e Isaac com cristãos. O primeiro se transforma, em sua interpretação, em filho ‘carnal’, pois nasce da serva Agar; o outro, filho de Sara ‘a livre’ será considerado o filho legítimo. “Não há distinção entre judeu e grego – proclama Paulo – pois ele é Senhor de todos...” (Epístola aos Romanos, 10: 11). De fato, ele afirma que não há diferenças entre o cristão (judeu nas sua palavras) e o grego. O objetivo é mostrar o caráter universal do cristianismo e, com isto, aclimatar a nova religião à visão de mundo grega. A Bíblia já tinha sido traduzida pelos Setenta sábios no séc. III a.C. (a tradução fora encomendada por Ptolomeu II para a biblioteca de Alexandria). Depois do séc. IV haverá realmente uma progressiva transformação do cristianismo em religião oficial do império romano. Paulo, no séc. I defende sua nova interpretação a partir do texto bíblico que havia absorvido aspectos decisivos do mundo grego e, num famoso versículo, uma inversão radical da leitura: “Agora vemos em espelho/ e de maneira confusa,/ mas, depois, veremos face a face” (Coríntios I:13,12). Como efeito desta leitura, o texto do Antigo Testamento é rebaixado a mera sombra platônica, antecipação da nova revelação, da nova aliança: “nada mais dizendo senão o que os Profetas e Moisés disseram que havia de acontecer” (Atos dos Apóstolos 26: 22)”[30].
Não todos os autores concordam com a existência de uma polarização dentro da tradição ocidental, entre as duas concepções, a ‘judaica’ e a ‘cristã’. O historiador A.Momigliano, por exemplo, é um autor que recusa com muitos argumentos a existência desta contraposição[31]: “Não sinto nenhuma atração pela vaga terminologia que nossos teólogos exibem. Em alguns casos, eles opõem indoeuropeus aos semitas, em outros os gregos aos hebreus, em outros ainda os gregos aos hebreu-cristãos ou unicamente aos cristãos. Não se procura definir tempos, lugares, autores. Afora isso, ao menos alguns dos nossos teólogos possuem idéias muito ingênuas a propósito da uniformidade do pensamento grego e da continuidade do pensamento hebraico”[32].  O autor citado recusa uma contraposição radical entre ‘visão de mundo judaica’ e ‘visão cristã’, pois ele suspeita que por trás dela aflore um preconceito racista, manifesto em pesquisadores anteriores ao fim da Segunda Guerra Mundial. O argumento que ele usa, ou seja a impossibilidade de estabelecer uma continuidade no pensamento hebraico ou cristão (a ‘uniformidade’), é fundamentalmente correto, pois dentro da tradição judaica ou cristã convivem inúmeras perspectivas e interpretações diferentes. Segundo afirma Robert Alter[33], é difícil definir se há ou não uma verdadeira e comprovada unidade entre os textos do Antigo Testamento, pois o princípio da ‘canonização posterior’, se torna, evidentemente, a releitura autorizada, embora os textos sejam heterogêneos. É fácil detectar na leitura de Paulo uma mistura de elementos gregos, da filosofia platônica, com os elementos do Antigo Testamento, já muito misturados com outras tradições[34].
Há, porém, alguns elementos de distinção que podem ser identificados. Um deles é a própria postura de Paulo en sua releitura radical, pois ela mesma estabelece uma contraposição, portanto insinua a existência de duas tradições: uma interpretação, posteriormente canonizada, que cria um mito que, por sua vez, estabelece um prisma de leitura. Outro elemento de diferenciação é o estatuto da escrita e, de conseqüência, o estatuto da interpretação nas duas tradições.

O mito da escrita alfabética em Moisés e Thot

Em relação ao estatuto da escrita, pode-se dizer que há duas cenas fundadoras da origem da escritura em nossa tradição. Unicamente duas: o texto do Antigo Testamento, e particularmente a cena do Decálogo ligado à figura de Moisés, por um lado. E a lenda de Thot, que Platão apresentou em seu Fedro, por outro. O primeiro teve sua importância relegada quase que exclusivamente à tradição religiosa. Ao contrário, a lenda de Thot exerceu a maior influência no pensamento ocidental. Embora os dois mitos tenham um estatuto muito diferente, pois estiveram ligados a diferentes tradições interpretativas, pode ser muito produtivo compará-los. Nenhum dos dois mitos se fundamenta em fatos históricos; nem são históricas as figuras de Moisés e de Thot. Afora isso, a escrita alfabética não surgiu certamente da forma com que os textos da Bíblia e do Fedro o relatam. Já havia escribas no séc. VI a C., quando o texto do Êxodo foi redigido, ou no séc. XIII a.C., à  época em que o próprio texto bíblico situa a vida de Moisés. O deus Thoth do Fedro de Platão é muito provavelmente uma invenção do filósofo grego, e substitui Palámedo ou Prometeu, mitos que estavam ligados à invenção da escrita na tradição grega[35]. No texto bíblico, a escrita alfabética sugere a existência de um vínculo histórico com a libertação do povo judeu da escravidão no Egito, pois à revelação segue-se a libertação e o Êxodo.
Dentro da tradição interpretativa judaica, há uma defesa da liberdade de interpretação e, particularmente, da interpretação infinita. Na Cabala, uma tradição exegética e mística dentro do judaísmo, esta questão é muito forte: “Existem 600.000 aspectos e significados na Torá. De acordo com cada uma dessas maneiras de explicar a Torà, a raiz de uma alma foi moldada em Israel. Na Era Messiânica, cada um entre os homens de Israel lerá a Torá de conformidade com o significado peculiar de sua raiz. E assim, também, é a Torá compreendida no Paraíso”[36]. Já, ao contrário, o mito de Thot atribui à escrita um valor negativo e confirma a teoria platônica do conhecimento: as idéias são inatas, de consequência o texto deve ser considerado efêmero e imperfeito[37]: “O jovem deus Thot, o inventor dos números e dos jogos de dados, apresentou sua nova invenção, a escrita ao deus soberano e solar, Tamuz...; Thot a define como uma ‘droga para a memória e para a sabedoria’... Tamuz contradiz essa definição: a escrita só fará aumentar o esquecimento dos homens pois eles colocarão sua confiança ‘em signos exteriores e estrangeiros’ ao invés de treinarem a única memória verdadeira, a memória interior à alma...” A visão apresentada por Thot responde a uma visão depreciativa da função da escritura dentro da tradição ocidental, segundo a conhecida análise de Jacques Derrida: “A escritura, a letra, a inscrição sensível, sempre foram consideradas pela tradição ocidental como o corpo e a matéria exteriores ao espírito, ao sopro, ao verbo e ao logos[38]. Entre uma visão do texto aberto à interpretação de todos os leitores e, por outro lado, a limitação da interpretação, que o próprio Platão defende por motivos até comprensíveis[39], há uma diferença muito grande e, embora a origem dos dois mitos seja tão diferente, uma contraposição entre eles pode-se tornar muito produtiva para se investigar as raízes do antisemitismo ocidental. A hipótese que subjaz esta indagação e que justifica uma comparação aparentemente tão arbitrária, é de que haja dentro da tradição ocidental um conflito mortal entre dois mitos originários. Nascidos ambos dentro da tradição da cultura alfabética ocidental, eles podem ser considerados membros de uma única ‘família’. Caim e Abel representariam simbolicamente os conflitos posteriores (entre Moisés e Thot, Isaac e Ismael, etc.). Estaria justificada, aqui, a disputa pelo direito à primogenitura entre Thot e Moisés, ou seja, entre a cultura greco-cristã e a cultura judaica. Há outros elementos em jogo, que respondem ao princípio do conflito dentro de uma única família: desde sempre, a vertente judaica da tradição se considera ‘o povo eleito’, o que pode ser interpretado como ‘o povo preferido pelo pai’. A outra vertente, porém, gaba-se de possuir vínculos de parentesco muito próximos com os deuses, a começar pelos heróis gregos e romanos. Há, também, um resquício de preconceito de um em relação a outro, pois Moisés pode ser considerado representante de uma cultura mais primitiva e grosseira, enquanto Thot representaria uma civilização mais refinada.
As duas cenas da escritura podem ser considerados simbolicamente os núcleos de um conflito entre duas tradições. É possível, porém, interpretar, como o faz Bettelheim com a história dos dois irmãos, que os dois mitos representam duas versões diferentes de uma cena originária dentro de uma única tradição, cuja identidade se expressa exatamente por uma duplicidade. Este ponto de vista permite aceitar duas perspectivas diferentes de leitura, fundamentadas nas duas concepções da escrita apresentadas.
Andrea Lombardi
Professor de Literatura Italiana da USP



[1] Onde está nosso irmão Abel? Capítulo do volume História, memória, literatura – O testemunho na Era das Catástrofes. Campinas: Editora Unicamp, 2003.org. Márcio Seligmann-Silva. São Paulo: Iluminuras, 2001
Este texto nasceu como desdobramento do artigo “Ética da Memória” (Revista CULT,  maio de 1999, Dossier literatura de testemunho, org. Nestrovski, A. e Márcio Seligmann-Silva).  Considero a reflexão sobre Caim e Abel como um aspecto preliminar para analisar o tema literatura de testemunho,  que se situa no entrecruzamento entre literatura, história e psicanálise.
[2] Kinder- und Hausmärchen gesammelt durch die Brúder Grimm[Contos maravilhosos para crianças e para a família, recolhidos pelos irmãos Grimm]. Baden-Baden: Insel, 1984, vol I, p. 347
[3] Bettelheim, Bruno. Il mondo incantato [The uses of inchantment. The Meaning and Importance of fairy Tales]. Milano: Felrinelli, 1982, p. 95
[4] Op.cit., p. 29
[5] Italo Calvino. Fiabe Italiane. Milano: Mondadori,  1981, p. 13
[6] Op. cit., p. 50. Em Calvino há uma evidente tentativa de valorizar o elemento pretensamente ‘harmônico’ das fábulas italianas – seus temas básicos seriam Amor e Psíque – em contraposição à ‘barbárie germânica’.
[7] Fusillo, Massimo. L’altro e lo stesso. Teoria e storia del doppio. Firenze: La Nuova Italia, 1998
[8] O ensaio de Sigmund Freud “Das Unheimliche”, de 1919  trata deste tema
[9] A Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulinas, 1985
[10] Graves, Robert e Raphael Patai. I miti ebraici [Hebrew Myths. The Book of Genesis]. Milano: Longanesi, 1980, p. 105. As informações sobre Caim e Abel provém deste texto.
[11] Metzger, Bruce M. e M. D. Coogan. The Oxford Companion to the BibleOxford, 1993 verbete Cain
[12] Graves, op. cit.,  p. 108 
[13] Bíblia de Jerúsalém. São Paulo: Paulinas, 1985
[14] A lei de Moisés e as ‘Haftarot’. Rio de J.: Comunidade Sefaradí de Miami, s.d.
[15] Bíblia de Jerusalém, op. cit., p. 2283 (“Primeira Epístula de São João”)
[16] Segundo o Vocabulário de Psicanálise, op. cit.,  Freud reserva  o termo sadismo  para associação da sexualidade e da violência exercida sobre outrem (p. 605). O mesmo Vocabulário  admite que “No entanto, de uma forma menos rigorosa, [Freud] chama às vezes sadismo apenas o exercício desta violência, para além de qualquer satisfação sexual” (ib.). Em “Uber infantile Sexualtheorien” [Sobre Teorías Sexuais Infantís], Studienausgabe, op. cit., Bd V, p. 173, Freud menciona a agressividade entre irmãos: “O  filho mais velho manifesta uma explícita inimizade contra seu concurrente, que o leva a um comportamento hostil , a desejos que ‘a cegonha o leve embora’ e, ocasionalmente, a pequenos atentados contra a criança indefesa no berço.”
[17] Benjamin, Walter. “Sobre o Conceito de História” In:   Obras Escolhidas. São Paulo: Brasiliense, 1985,  p. 225
[18] Sigmund Freud. Trauer und Melancholie. In:  Studienausgabe, vol. III, Frankfurt M.: Fischer, 1982, p. 197. As próximas citações estão na p. 199, 198, 205 respectivamente.
[19] Sigmund Freud. Totem e Tabu. In:  Studienausgabe, vol. IX, Frankfurt M.: Fischer, 1982, p. 350.
[20] Laplanche, op. cit.,  p. 607
[21] Sigmund Freud. “Eine Teufelsneurose im Siebzehnten Jahrhundert”. In: Studienausgabe, Band VIIFrankfurt A. M.: Fischer, 1982. As citações seguintes correspondem às p. 295-7
[22] Sartre, Jean Paul. Ebrei.[Réflexions sur la question juive]. Milano: Comunità, 1948, p. 68
[23] Bori, Piercesare. Il vitello d’oro. Le radici della controversia antigiudaica [O Bezerro de ouro. A Raíz da Polêmica Antijudaica]Torino: Boringhieri, 1983
[24] Hannah Arendt. Sur l’antisémitisme.  op. cit. ,  p. 87. Veja-se também: Margarete Mitscherlich “Antisemitismus – eine Männerkrankheit”  [Antisemitismo – Uma doênça masculina] In: Die friedfertige FrauFrankfurt: Suhrkamp, 1985
[25] Primo Levi. Conversazioni e interviste. Torino: Einaudi, 1997, p. 269
[26] Veja-se, a este propósito, Léon Poliakov. O Mito Ariano. op. cit., particularmente o capítulo “A língua e a raça”, p.65 e seg.
[27] Hilberg, Raul La distruzione degli ebrei d’Europa. [The Destruction of the European Jews].  Torino: Einaudi, 1999. Veja-se, também, em: Wiesel, Elie. Holocausto. Canto de uma Geração Perdida. Rio de Janeiro: Ed.  Documentário, 1987, p. 14
[28] Os textos de Hannah Arendt, Les origines du totalitarisme. Sur l’antisémitisme.  [de The Origins of Totalitarism]. Paris: Seuil, 1984 de Léon Poliakov. O Mito Ariano. São Paulo: Perspectiva, 1974, e Arnaldo Momigliano. La storiografia greca Torino: Einaudi, 1982 comentados abaixo, aprofundam esta hipótese.
[29] Segundo Simon, Marcel e André Benoit. Giudaismo e cristianesimo  [Le judaïsme e le christianisme antique. d’Antiochus Epiphane à Constantin] Bari-Roma: Laterza, 1985, p. 10 e 58 e seg,  helenismo e judaísmo entram em conflito desde a época da redação do livro de Daniel, provavelmente no séc II a. C.
[30] Uma consideração irônica sobre a citação de Paulo (Coríntios I: 12) encontra-se num texto de Jorge Luiz Borges: “O Espelho dos Enigmas”  In: Nova Antologia Pessoal. São Paulo: Difel, 1982
[31] Momigliano, Arnaldo. La storiografia greca , op. cit. examina, entre outras, a obra de T. Boman. Das Hebräische Denken im Vergleich mit dem Griechischen [O pensamento ebraico em comparação com o grego] Göttingen: Vandenhoeck, 1968, G. von Rad. Theologie des Alten Testaments [Teologia do Velho Testamento] München: Kaiser Verlag, 1966, em relação à noção de tempo, e a de R. Bultmann. Geschichte und Eschatologie. [História e Escatologia], Tübingen, 1958,  acerca da noção de conhecimento.
[32] Momigliano, op. cit.,  p. 68
[33] Robert Alter. “Introdução ao Antigo Testamento”  in: Guia Literário da Bíblia. São Paulo: Unesp, 1997,  p. 25.
[34] Marcel Simon e André Benoit, op. cit.,  p. 60 e seg.
[35] Mario Vergetti”Dans l’ombre de Thot. Dynamiques de l’écriture chez Platon”, apud: Jeanne-Marie Gagnebin, op. cit., p. 55
[36] Scholem, Gerschom. A Cabala e seu Simbolismo. São Paulo: Perspectiva, 1978, p. 80
[37] Vale a pena citar aqui a lenda de Thot do Fedro, na versão de Jeanne-Marie Gagnebin. Sete Aulas sobre Linguagem Memória e História.. Rio de Janeiro: Imago, 1997, p. 57-8
[38] Derrida, Jacques. Gramatologia.  São Paulo: Perspectiva, 1973, p. 42
[39] A expulsão dos poetas e os sofistas da República simboliza, de certa forma, a expulsão dos criadores do texto e de seus intérpretes. pois objetivo de Platão é defender a sociedade grega contra os perigos de sua dissolução. Veja-se o texto de Havelock. Cultura orale e civiltà della scrittura [Preface to Plato] Bari: Laterza, 1983,  que aponta a existência de um vínculo entre a introdução da escrita, teorizada por Platão, e os problemas políticos e jurídicos, por ele examinados.