domingo, 11 de abril de 2010

















Um leitor como testemunha










A obra de Emilio Villa (1916-2003)
Andrea Lombardi




















“E nós nos encontramos sem ordem e sem revolução, / magnanimos e cadúcos, e parece bonito/ termos errado em muitos, todos” Emilio villa
Emilio Villa, 1943 Nascido em Affori (Milão) em 1916, Emilio Villa foi seminarista e, posteriormente, especialista em línguas antigas (traduziu algumas tabuletas mesopotámicas na década de ´30). Naquele período começou sua carreira como crítico de arte, a principal atividade da vida dele e, ao mesmo tempo (quase um paralelo constante) sua atividade de escritor de poesias.









































Suas escolhas sempre foram voltadas para a vanguarda, a experimentação, a novidade, as expressões de misturas e hibridaçoes internacionais.
Um exemplo de sua poesia é um texto escrito em “língua brasileira”, durante a estadia de Villa em São Paulo, entre 1951 e 1952, a conite do então diretor do MASP (que acabava de se mudar para a Avenida Paulista).



















Mata-Borrão para Flavio Motta




(poesia di Villa innel suo portoghese brasiliano)





De Opere Poetiche I, a c. de A. Tagliaferri. Milão: Coliseum, 1990
eu diria l’m encantado, e então
uma nuviosa designação de continentes involuntarios por jogos
nasais, fundos jogos, acende
ao lonje entre os anos desperdidos itinerantes
como faiscas de amarguras
abdominais, como bichos de cristal na nuca muda, acende
o nome mais amado mais miolo mais milagre
e o quem diz: “agora!”e o quem
cai no corte mitico do mundo, nas luminosas
trovejadas generações dos nomes: léxico
jejum e fresco come o prado de espinafre de trevo
no recóncavo, pálidas requisições de ecos
e espirros e réplicas, anforas anoitecidas
no pulmão gigante, palpitantes gengivas, cenoiras
africanas, paleoafricanas, protoafricanas, coxas
rasgadas o abertas, polpas de aboboras
ideais: agora, agora. Nam rectitudo
per se est phallica, truncada também,
devagazinha:

onde uma zigoma torna-se sigla e sigilo, torna-se constellação deitada nas escuras polpas sem nomes e incha-se então de raiva a fonte das medidas e das mudançãs, lá, eu digo, provocar o poder subhumano da pasmação, do broto não mortal, o voo ocioso, o ganir chupado, de viboras nas câimbras
das vagas, dos grans, e veremos lampejar
a alta caça, a esgrima em voz baixa na caveira, as balanças de ossos afrouxa
o orvalho, e o remo corta em dois as cinzas
dos vibos e as cinzas dos sons,
eschatologicos, agora mismo, si o sangue da sombra não é sangue ni sombra si o cavalo do cavalo agora é sombra desmaiada o sombra brotada na suma sombra ostra, o som da tromba saca o celeste descontecer, como na páscoa dos continentes cortó o Brazil e a Angola, cortó as arvores da ciencia e as arvores da loucura
peregrinante, cortó o tubarão em dois espelhos a tromba grande: não agora.
Bahia, 1951









Em sua vida Villa sempre defendeu sua intuição, em relação a dois grandes da pintura italiana. Os dois foram por Villa “descobertos” ainda muitro cedo, no final da década de trinta, início de quarenta. Villa reconhece, sobretudo no primeiro, um grande mestre: aqui alguns de seus famosos sacos queimados: Alberto Burri























Burri Alberto cultiva como in vitro, ou melhor, em linho, essas anatomias contráteis dos organismos inexpressos, incertos entre uma aparência de materiais biológicos sem uso e um ideal de fulmíneos universos desde o gigantesco até o mínimo do mínimo: uma ambigüidade escancarada, um desejo de estreitar recordações de coisas que devem ser clareadas; lamentosa cosmogonia imaginada com a simples inocência de materiais comuns, dos trapos jogados do bairro, das tintas de má qualidade, das massas amorfas entre apodrecimento e cristalização...” (1953)



Note-se o tom solene de Villa: Burri, Alberto e não o usual Alberto Burri, que para um amigo e colega de arte seria normal. O estilo de Villa, mesmo em suas críticas, permanece peculiar: entre uma proximidade total, uma adesão incondicionada e um rebuscamento elegante, uma distância radical. Literatura é tensão, é aporia entre esses dois limites impossíveis de conviver, necessário para constituir um texto
Burri antecipa a descrição de um mjndo, opu melhor: a metáfora de um mundo que é do sobrevivente. Materiais e intervenções são radicais.



Lucio Fontana o segundo artista famoso que deve a Emilio Villa parte de sua notoriedade, surge na década de Cinqüenta, com seus agressivos e poderosos rasgos dos seus míticos sacos. Ação de pintura, mais do que pintura, que contém em si o ato cronológico, a memória de algo que “realmente aconteceu”. Espaço, tempo e profundidade, com essa ação não seguirão-se mais planos. Tudo sera revolucionado. Nasceu na Argentina, mas viveu depois na Itália, onde faleceu em 1968 .

De VILLA, Emilio. Attributi dell´arte odierna. Milano, Feltrinelli, 1968
ALBERTO BURRI



Nossa humilde cosmogonia, elegíaca aterrorizada composita, epos para instantâneas tragédias cotidianas, miniatura rapsódica das grandes formações do tempo, sem vestígios ou eventuais, o grande sangue, os traçados do mundo sem descanso, a lei que dita a borda aos pedaços de uma visão a ser instaurada como matéria e como surpresa, a divagação profética das linhas que modelaram as formas dos arquipélagos e o perfil das penínsulas e o esqueleto das trutas nas águas do Adda.
Na memória das palafitas, há muito que pode se tornar matéria de uma breve e consternada superfície de pintura, mas pintura por assim dizer; e ao invés daquela qualquer outra ação realizada para revelar sentidos específicos e não discutíveis:
pBurri Alberto cultiva como in vitro, ou melhor, em linho, essas anatomias contráteis dos organismos inexpressos, incertos entre uma aparência de materiais biológicos sem uso e um ideal de fulmíneos universos desde o gigantesco até o mínimo do mínimo: uma ambigüidade escancarada, um desejo de estreitar recordações de coisas que devem ser clareadas; lamentosa cosmogonia imaginada com a simples inocência de materiais comuns, dos trapos jogados do bairro, das tintas de má qualidade, das massas amorfas entre apodrecimento e cristalização...”
(1953)
Note-se o tom solene de Villa: Burri, Alberto e não o usual Alberto Burri, que para um amigo e colega de arte seria normal. O estilo de Villa, mesmo em suas críticas, permanece peculiar: entre uma proximidade total, uma adesão incondicionada e um rebuscamento elegante, uma distância radical. Literatura é tensão, é aporia entre esses dois limites impossíveis de conviver, necessário para constituir um texto
Burri antecipa a descrição de um mundo, ou melhor: a metáfora de um mundo que é do sobrevivente. Materiais e intervenções são radicais.



VILLA ARTISTA PLÁSTICO
E, finalmente, veja-se a arte de Villa. Ele próprio escritor, crítico, poeta, escultor e tradutor, se manifesta em todas esferas das artes de forma homogênea: provocativo e rebelde, erudito e elegante, de uma escolha sempre fortemente expressiva, ao ponto de poder filiá-lo anacronicamente ao expressionismo, posto que ele teve contato com o Dadaísmo. Mas, ao memso tempo,






Villa é amante da Arte povera. Arte pobre. Como Lucio Fontana e Alberto Burri. Villa, amante de cores e sons espessos.







Em sua tradução do conjunto da Odisséia, Villa afirma de ter enfatizado a influência dos antigos dialetos gregos, antes da unificação linguística. De suma importância são suas considerações sobre a Odisséia como instrumento de memória religiosa no contexto grego.
Em 1971, Villa assinava a sua Nota do tradutor de um esforço por si só imenso: a tradução da Odisséia completa (OMERO, 1994). No texto, uma veemente e muito empenhada afirmação do campo:
Pensando que deva ser considerada já bastante decrépita, por um lado, vã, por outro lado, sem sentido e, enfim, escassamente objetiva e toda apenas conjecturada, a fluvial linguagem operada pela pesquisa assim chamada ‘estética’, feita pelos nossos filósofos e pelos nossos professores antigos, de uma época, numa santificada e fora de lugar e confusa aura crociana. O pior, em toda essa aproximação, naquela espécie de divagação áulica e crepuscular, era a a consideração do “real”, do “lírico”, entendidos como produtos superiores do espírito; era a recusa do assim chamado “formulário”, isto é, do material, da matéria, do que exatamente é feita a vida e a razão do epos homérico... (OMERO, 1994, p. 349).


Prima o poi, poi o primale parole dette, le parole scritte,presto o tardi tutte le parolesono destinate a sparirespariscono.
Le parole sulla carta, le parolesulle pietre, le parole sui ramispariranno tutte.
Se queste parole e non parolesono scritte su materieche presto si decompongono, chedurano poco più di unattimo o poco più di un millennioche cosa esse sono. “
E nós nos encontramos sem ordem e sem revolução, / magnanimos e cadúcos, e parece bonito/ termos errado em muitos, todos”